Marco,
Você, como sempre enriquece muito o nosso glossário.
Vamos ver se também ajudo um pouco...
O uso das metáforas nos remete ao escorregadio do imaginário e a certas "armadilhas" conceituais.
Concordo com você quanto à insuficiência da "teia" - e para mim de qualquer modelo ou matáfora - para exemplificar o hipertexto, mas os modelos nunca são suficientes para explicar o que queremos, principalmente quando o objeto é muito complexo. São, como diz Pierre Lévy, "pequenas totalidades, mas sem nenhuma pretensão ao universal.".
Para Lévy o hipertexto faz parte da própria lógica humana do pensamento, funcionando caoticamente (no bom sentido) e construindo cognições que surgem por conexões.
Gosto do exemplo que ele usa, da frase “a maçã contém vitaminas”,e das múltiplas associações que dela derivam.
Podemos considerar, assim, o hipertexto como uma linguagem associativa não-linear.
Resgato, ainda, as caracerísticas que Lévy atribui ao hipertexto em As tecnologias da inteligência: o futuro do pensamento na era da informática, e que o tornam dinâmico, em permanente movimento:
1) Metamorfose - uma rede hipertextual está em constante construção e renegociação, sua extensão, composição e desenho estão sempre abertos.
2) Heterogeneidade – o hipertexto comporta e associa de todas as formas imagináveis uma gama de elementos (imagens, sons, palavras, sensações, modelos, conexões lógicas, pessoas, grupos, artefatos, mensagens muiltimídias, multimodais, analógicas, digitais).
3) Multiplicidade e encaixe das escalas – o hipertexto se organiza de modo “fractal”, qualquer nó ou conexão pode revelar-se como sendo composto por toda uma rede, indefinidamente.
4) Exterioridade - a rede não possui unidade orgânica nem motor interno, sua composição e recomposição permanente dependem de um exterior indeterminado.
5) Topologia – no hipertexto tudo funciona por proximidade, por vizinhança; o curso dos acontecimentos é definido pelos múltiplos caminhos trilhados.
6) Mobilidade dos centros – a rede não tem um centro, mas diversos centros, móveis, que saltam de um nó a outro, num constante configurar e reconfigurar de mapas.<?XML:NAMESPACE PREFIX = O />
Indo um pouco mais além, vejamos como a matriz conceitual básica do hipertexto pode ser encontrada em longínquos momentos, como no imaginário africano, na mitologia yorubá, através de Olorum.
Ele é o criador do céu e da terra. Não é representado sob nenhuma forma material, seus atributos são a totalidade, a perfeição e a universalidade. Criou para a terra dezesseis odus principais ou destinos possíveis. Cada um dos principais desdobra-se em dezesseis, chamados Omo-Odu, perfazendo um total de 256 odus. Criou também uma multiplicidade de orixás, com o fim de prestar serviços de criação e administração das coisas do mundo, com a incumbência, inclusive, de proteger os seres humanos.
Olorum dotou cada matriz modeladora do universo de vários compartimentos. Estas se tornaram capazes de gerar matrizes geradoras que funcionassem oa mesmo tempo e criassem um portal de acesso para cada coisa modelada, numa rede infinita de possibilidades, assim como acontece no hipertexto.
Para alguns autores o hipertexto e a teia possuem forte analogia:
"Teia é contiguo ao conceito de rede. Tem particular importância enquanto designação corrente daquilo a que Kristeva e Rifaterre denominaram de linguagem aberta. O conceito de teia remete desde logo para a configuração do próprio sistema informático e da expansão da world wide web. O sistema de comunicação, na transição do século XIX para o XX, uma radical revolução do conhecimento: adensam-se durante a Segunda metade do século XX as explorações que traçaram a passagem da galáxia de Gutenberg para a galáxia de Marconi." (http://209.85.215.104/search?q=cache:MO3J7tSoRh0J:www.citi.pt/ciberforma/antonio_baptista/conceitos.html+hipertexto+mais+teia&hl=pt-BR&ct=clnk&cd=7&gl=br&lr=lang_pt)
Em Serpa (2000), encontramos: "Um novo fio tecido modifica o sentido e o significado de todos os fios da teia.". (SERPA, Luiz Felippe Perret. Orientação coletiva. In: Reunião do grupo de pesquisa Educação e Comunicação da FACED/UFBA. Salvador, 16 de novembro de 2000, apud BONILLA, Maria Helena S. Escola aprendente: desafios e possibilidades postos no contexto da sociedade do conhecimento. 2002. Tese, Faculdade de Educação, Universidade Federal da Bahia, Salvador - BA, p. 183-188).
Realmente, a teia e o labirinto são as metáforas mais comuns para definir o hipertexto. Recomendo a todos uma boa leitura - "O que é o hipertexto electrónico e de que forma altera a organização e a utilização dos textos?", de Andreia Cordeiro, disponível em http://www1.ci.uc.pt/diglit/DigLit%20Ensaios/Ensaios%202003-2004/Ensaio07.htm#_ftn2.
Marco, uma boa provocação sempre desencadeia polêmicas construtivas e, para mim, muito divertidas.
Obrigada por essa oportunidade maravilhosa.