2. Atentar para as interações 1

Atentar para as interações 1

Marianne Hardy e co-autores (1991) se propõem a definir as idéias fundamentais sobre as quais repousa sua pedagogia de inspiração construtivista e caracterizar as práticas educativas que a acompanham. E o fazem enfatizando sua posição contrária à transmissão de conhecimentos onde o professor se limita ao discurso pré-construído sem troca verdadeira com os estudantes.

Eles criticam o professor que expõe, explica e interroga, enquanto os estudantes devem escutar, compreender e responder. Em oposição a esse perfil de professor, os autores dão atenção às interações e evocam a autoria do professor na promoção de mais e melhores interações.

A crítica dos autores é válida, mas revela algo inaceitável sob o ponto de vista dos fundamentos da interatividade: Eles dizem que não são mais os estudantes que têm que seguir o mestre, mas este último que tem que seguir os estudantes para poder inserir-se no urdir do seu pensamento e trazer no momento propício elementos de conhecimento ajustados às questões que se colocam os estudantes.

Sabemos que colocar o aluno no centro do processo é fazer a mudança de um pólo a outro e recair em simplificação: antes o professor, agora o aluno. Falta a noção de professor como designer de software, como webdesigner. Os autores atentam para a materialidade da ação comunicativa, mas não especificam um investimento na materialidade da ação comunicacional.

Ainda assim, suas contribuições são valiosas. Elas podem ser resumidas em cinco princípios:

  1. Aprender é construir o saber em interação com outrem.
  2. Suscitar a expressão e a confrontação.
  3. Interpretar as atitudes dos estudantes.
  4. Trabalhar em pequenos grupos interativos.
  5. Trabalhar com outros professores, atores e gestores da instituição e da comunidade.

1. Aprender é construir o saber em interação com outrem.

M. Hardy e co-autores (1991) fazem esta sugestão baseados em uma concepção de aprendizagem construtivista, cunhada a partir de J. Piaget e L. S Vygotsky.

Esta concepção de aprendizagem tem sido exaustivamente disseminada ultimamente e pode ser sintetizada do seguinte modo: há a contribuição do sujeito nas suas trocas com o objeto e com o meio e há também papel destes na estruturação do conhecimento e das condutas do sujeito. É por meio da interação com o meio que o sujeito constrói suas estruturas mentais e seu conhecimento, sendo ambos os termos indissociáveis. Dito de forma sintética: é estruturando o universo que o sujeito se estrutura.

O sujeito conhece na interação e não na recepção passiva submetida ao falar-ditar do mestre. Na sala de aula, as estratégias do professor podem ser:

  • Fornecer material para análise e pesquisa que implique em posicionamentos compartilhados, tomada de decisões em grupo.
  • Estimular os estudantes a resolverem coletivamente com autonomia os problemas apresentados
  • Reagir às colocações dos grupos, dialogar, esclarecer, dar a sua opinião, agregar.
  • Interferir nas diferentes etapas de elaboração do trabalho. Deixar transparecer sua opinião sobre o assunto.

2. Suscitar a expressão e a confrontação

Os autores formulam perguntas básicas do tipo: quais práticas operar para favorecer a construção interativa dos saberes nas instituições educativas? Quais situações propor aos estudantes?

Começando sua ação por estas perguntas, o professor deve ter claro que o ponto essencial é o das interações entre os estudantes e que estes não são copos vazios que os docentes deveriam encher. A prioridade à livre expressão dos estudantes não deve ser somente autorizada, mas encorajada.

Não há dúvida: "suscitar a expressão e a confrontação" é sugestão oportuníssima, mas falta o tratamento da comunicação. Ela é decisiva tanto como ambiência onde se dá a expressão e a confrontação, quanto como condição de motivação dos alunos à expressão e confrontação.

O professor favorece a reação e o debate entre os estudantes. Entre as ações que podem ser colocadas em prática estão:

  • Encorajar os estudantes a exprimir seu ponto de vista e a confrontá-lo com o de outras pessoas.
  • Criar na classe um clima de democracia, cooperação e confiança que favoreça a troca de experiências entre os estudantes e os grupos.
  • Estimular a auto-expressão dos estudantes.
  • Estimular os estudantes a defenderem seus pontos de vista.

3. Interpretar as atitudes dos estudantes

Esta sugestão diz respeito ao aguçamento do olhar do professor de modo que sua apreensão das atividades desenvolvidas pelos estudantes torna-se cada vez mais pertinente. É preciso que o professor possa ver que tudo que os estudantes fazem tem um sentido. Cabe a ele aprender a cavar esta significação.

Os autores concluem em suas pesquisas que os professores têm freqüentemente uma representação dos processos de aprendizagem que não correspondem às atitudes reais dos estudantes. O aguçamento do olho pode modificar esta conduta, pode levar a surpresas diante dos saberes já adquiridos e das capacidades insuspeitas de aprender que os estudantes manifestam.

A capacidade de olhar e de interpretar as atitudes dos estudantes pode ser aguçada por meio de algumas ações:

  • Valorizar e incorporar as atitudes dos estudantes.
  • Reagir às atitudes solicitadas e não solicitadas dos estudantes.
  • Aceitar as atitudes e proposições dos estudantes, mesmo que à primeira vista estas lhes pareçam esdrúxulas.

4. Trabalhar em pequenos grupos interativos

Trata-se de outra sugestão valiosa com que os autores definem a sala de aula onde não é mais o professor que ocupa sempre o defronte da cena. A prioridade é concedida à expressão dos estudantes e ao desenrolar de suas atividades tais como eles são capazes de conduzi-la por si mesmos.

Os "pequenos grupos interativos" configuram o meio que favorece ao professor suscitar a expressão e a confrontação dos estudantes, aprender a observar e a interpretar suas condutas. E aos estudantes, esse meio favorece a expressão de cada um e a confrontação dos parceiros.

Ao adotar a estratégia de trabalhos em grupo, o professor pode proporcionar aos alunos um meio de eles se expressarem e conduzirem suas atividades. O professor pode também atuar de várias formas:

  • Identificando a dinâmica que melhor funciona para a formação dos grupos: de forma espontânea ou arbitrária.
  • Prestando atenção ao que acontece nos grupos.
  • Estimulando a expressão de cada um e a confrontação de parceiros.
  • Intervindo nas atividades dos grupos (cessando ou estimulando uma discussão.

5. Trabalhar com outros professores, atores e gestores da instituição e da comunidade

Esta sugestão refere-se ao entendimento coletivo dos professores e outros profissionais da mesma escola que proporciona a cada professor maior conhecimento da rede de interações que transcendem sua sala de aula.

Ou seja, todos se encontram em situação de pesquisa e aprendizagem. E desse "trabalho" coletivo depende o progresso da atenção às interações e promoção de mais e melhores interações.

Cada professor deve cuidar de envolver-se com o entorno de sua sala de aula, inclusive com o entorno de sua escola. Ele tem necessidade de se confrontar com outras pessoas implicadas na mesma realidade.

O professor atua além de sua sala de aula em proveito dela mesma. Os caminhos podem ser vários, a começar por:

  • Envolver-se com os outros profissionais (professores, diretor, funcionários) da escola onde atua.
  • Envolver-se com a comunidade a que sua escola pertence, por meio de, por exemplo, projetos em que os alunos pesquisam, promovem palestras e debates.