Fórum "Desafios à docência online na cibercultura"

Ciberspaço: inteligência colectiva ou visão unilateral?

Ciberspaço: inteligência colectiva ou visão unilateral?

por Usuário excluído -
Número de respostas: 5



« O Ciberespaço, interligação dos computadores do planeta, tende a tornar-se a principal infra-estrutura da produção, da gestão e das transacções económicas. Ele constituirá (...) o principal equipamento colectivo internacional da memória, do pensamento e da comunicação. (...) o ciberespaço e as comunidades virtuais, as suas reservas de imagens, as suas simulações interactivas (...) será o mediador por excelência da inteligência colectiva da humanidade"
(Pierre Lévy, Cibercultura, 1997:179)

Serão todas as idades, áreas geográficas, culturas e situações económicas ou académicas adequadas à utilização exclusiva dos métodos de docência online?
Até que ponto estaremos a promover uma visão unilateral, ao contrário da riqueza dos ambientes hipertexto,promovendo uma exclusão social no acesso a este tipo de formação?
Será esta exclusão uma condição essencial à utilização dos cursos online?

Propomos que possam dar o vosso contrubuto para o debate deste assunto e o possam alargar, com as vossas opiniões e contribuições, a outros temas e outros fóruns.

Até já :)
Aguardamos por vocês !
Em resposta à Usuário excluído

Re: Ciberspaço: inteligência colectiva ou visão unilateral?

por Usuário excluído -

Retomando os estudos de Santaella sobre a cultura das mídias revisitada na era da cultura digital, em seu livro lançado em 2007, pela editora Paulus, intitulado Linguagens líquidas na era da mobilidade, valemo-nos das palavras da pesquisadora (ibid., p. 127), para pensarmos o foco deste módulo – cibercultura e educação – em complemento à leitura dos textos, vídeos e podcast disponíveis neste módulo:

É a atual convergência das mídias no mundo ciber, na coexistência com a cultura das mídias, juntamente com as culturas precedentes, a oral, a escrita e a impressa, todas ainda vivas e ativas, que tem sido responsável pelo nível de exacerbação que a densa rede de produção e circulação de bens simbólicos atingiu nos nossos dias e é uma das marcas registradas da cultura digital.

 

De fato, a cultura digital ergue-se em meio à convergência das mídias, integrando, a um só tempo, as dimensões sociais global, local e glocal. Esta cultura – de natureza híbrida, nômade, volátil e mutante, no dizer de Santaella – nos imprime a necessidade, enquanto educadores, de pensar os novos contornos da constituição das subjetividades dos sujeitos sociais aprendentes, na era da cultura digital.

Contudo, pensar a constituição das subjetividades implica pensar a constituição das intersubjetividades. A perspectiva sócio-histórica vygotskyana já anunciava, no início do século passado, o quanto a construção do conhecimento se dá mediada pelos outros, diretamente, ou por meio de signos. Hoje, mais do que nunca, tais dinâmicas trazem desdobramentos diretos aos modos de aprender.

No vídeo disponível neste módulo, André Lemos nos traz a dimensão desterritorializante dos aparatos tecnológicos que compõem a cibercultura. Em outro vídeo disponível neste módulo, Alex Primo, em menção às gerações da web, sinaliza uma evolução comunicativa que parte da possibilidade de publicação, para a possibilidade de cooperação na web. Esse movimento evolutivo me remete, uma vez mais, ao imbricar entre subjetividade e subjetividade: foco de minha mais recente pesquisa de pós-doutorado, na Unicamp (Brasil), concluída em 2007. Dito de outra forma, a discussão sobre as mudanças nas relações intersubjetivas na web, de certo modo, coaduna-se com o conceito freireano de interação dialógica, o conceito habermasiano de agir comunicativo e o conceito bakhtiniano de dialogismo.

Todavia, para pensarmos todas estas questões com criticidade, sem cairmos no engodo da tecnofilia, é necessário trazer à baila outro aspecto fundamental: a inclusão digital. Tanto o vídeo do Alex Primo quanto este fórum postado pela Maria Graça Pereira (Ciberespaço: inteligência coletiva ou visão unilateral?) tocam nesta questão social candente. Desde os estudos de Lévy sobre cibercultura percebo a necessidade de relativizarmos as discussões sobre os caminhos interativos da humanidade. De que humanidade estamos falando? Quantos por cento da humanidade de fato têm acesso aos aparatos tecnológicos que tanto impactam o nosso cotidiano e, por conseguinte, a constituição das nossas subjetividades e intersubjetividades, sobretudo se considerarmos as circunstâncias históricas dos países periféricos?  Estas e outras questões devem estar na pauta de nossas preocupações, enquanto educadores socialmente engajados, se não quisermos falar de uma realidade para poucos (ao menos por enquanto), como se ela fosse intrínseca à humanidade como um todo.

Lucila Pesce

  

Em resposta à Usuário excluído

Re: Ciberspaço: inteligência colectiva ou visão unilateral?

por Marco Silva -

Lucila, faço um mapeamento da sua reflexão para mostrar o que entendi, para dizer que concordo com vc e para agregar um complemento.

Para situar do desafio do professor na cibercultura vc:

  1. cita a percepção da Santaella de que a “exacerbação que a densa rede de produção e circulação de bens simbólicos atingiu nos nossos dias e é uma das marcas registradas da cultura digital”;
  2. destaca destaca de Alex Primo a percepção de uma evolução comunicativa que parte da possibilidade de publicação para a possibilidade de cooperação na web .

Vc faz estas referências para chamar a atenção para um nova ambiência sociotécnica que favorece a constituição de novas subjetividades que por sua vez liberam uma dinâmica de intersubjetividades desafiadora para o professor.

Para vc, nessa nova ambiência cultural (a cibercultura) “ as mudanças nas relações intersubjetivas na web, de certo modo, coaduna-se (grifo meu) com o conceito freireano de interação dialógica, o conceito habermasiano de agir comunicativo e o conceito bakhtiniano de dialogismo”. E, ao dizer isso, vc chama a atenção dos professores desafiados pela “era das linguagens líquidas da mobilidade” para a atualidade oportuna desse quadro teórico.

Entretanto, vc faz dois alertas finalmente:

  1. devemos pensar com “criticidade” para “não cairmos no engodo da tecnofilia”
  2. “é necessário trazer à baila outro aspecto fundamental: a inclusão digital”.

Penso que será preciso mais do que inclusão digital. Será preciso inclusão cibercultural. Isto é, será preciso não apenas habilidade com o computador, com a internet e com a mobilidade. Será preciso familiaridade com o estar-junto online, como o compartilhamento online, com a interatividade, com a rede de participações colaborativas, com o que André Lemos chama de “liberação do pólo da emissão”, com o que Pierre Lévy chama de “inteligência coletiva”.

O professor pode ser ter excelente desenvoltura com o computador, com a internet e com a mobilidade, e não ter sensibilidade para a dinâmica cibercultural das intersubjetividades. Nesse caso ele perderá a oportunidade de perceber que essa dinâmica “de certo modo, coaduna-se” com “interação dialógica”, com “agir comunicativo” e com “dialogismo”.

Ademais, no cotidiano da sala de aula presencial infopobre e inforrica, o professor não tem tido oportunidade de experimentar proximidade com P. Freire, Habermas e Bakhtin, uma vez que prevalece a forte tradição da pedagogia da transmissão.

Em suma, quero dizer que não basta o ambiente sociotécnico do nosso tempo ser favorável ao engendramento de novas intersubjetividades; não basta investir na inclusão digital e cibercultural do professor. Antes ou concomitantemente será preciso desconstruir os ranços petrificados da milenar pedagogia da transmissão. A formação do professor para docência na cibercultura terá necessariamente que enfrentar seu maior desafio.

_____________________________ Abraço no livresco

A formação do professor na cibercultura precisará enfrentar a cultura analógica e livresca do professor, baseada na separação da emissão e da recepção e na distribuição de informação no modelo "um-todos". Precisará abraçar e dialogar com essa cultura cristalizada na escola e na universidade. Nesse clima de proximidade e de motivação poderá então convidá-lo à dinâmica da interlocução, da interatividade ou da intersubjetivdiade cibercultural.

Em resposta à Marco Silva

Re: Ciberspaço: inteligência colectiva ou visão unilateral?

por Usuário excluído -

Marco,

Achei muito pertinente sua afirmação a respeito da necessidade de "inclusão cibercultural", pois retrata bem a realidade das escolas públicas, pelo menos as da Bahia. Boa parte delas dispõe de um laboratório de informática sem uso, porque os professores não enxergam como podem utilizá-lo como suporte pedagógico, alguns por aversão, outros por medo. Há aqueles, é claro, que até se arriscam, mas ainda estão utilizando-no como uma mera substituição das tecnologias vinculadas à educação tradicional de transmissão.

Dessa forma, percebe-se a necessidade de exercitar o convívio no ciberespaço, o que você chama de "estar-junto online", ao ponto de passar a perceber este ciberespaço como uma extensão do espaço 'físico' em torno de cada indivíduo.

Infelizmente, a "sensibilidade para a dinâmica cibercultural das intersubjetividades", citada por você, não é algo que se pode internalizar lendo um texto ou participando de um curso de formação. Acredito que esta tal sensibilidade somente possa ser desenvolvimento na vivência cibercultural, e para isso, é preciso estar de 'coração aberto' para este novo paradigma, que inclui a premissa de pensar e agir coletivamente.

 

Em resposta à Usuário excluído

Re: Ciberspaço: inteligência colectiva ou visão unilateral?

por Marco Silva -

Jocelma, esse tema da inclusão cibercultural me ocorreu quando me dei conta de que não basta ter expertise com o computador off-line. É preciso ter expertise tb com o computador online, isto é, ter convicção de que estar-junto online pode significar uma experiência tão rica e profunda quanto a presencial.

Só a experiência online (da própria cibercultura, do ciberespaço) pode consolidar esta segunda expertise. Aqui temos duas explicações para a reação à educação online ou à EAD.

  1. Em primeiro lugar a educação online é confundida com EAD . Ou seja, a velha prática não presencial via mass media impressos, rádio e tv é colocada no mesmo patamar em que se encontra a educação online definida a partir "plataforma" e suas interfaces de comunicação. Sobre a distinção EAD e educação online, veja meu post aqui .
  2. Em segundo lugar há a exclusão cibercultural.

Atualmente venho buscando aprofundar a definição de exclusão cibercultural. Aceito colaborações.

Forte abraço, Marco

Em resposta à Usuário excluído

Re: Ciberspaço: inteligência colectiva ou visão unilateral?

por Usuário excluído -

Caro colegas professores(as), boa noite.

Tendo lido as reflexões de todos vocês especialistas em educação e, considerando minha trajetória de formação (BsC em Engenharia, MsC Administração e Doutorando em Educação), tentarei dar um pequena colaboração iniciando com uma afirmativa do que é Edudcação sugerida por Richard Mitchell, obtida em uma leitura filosófica que venho fazendo sobre como Sócrates interpretava a vida.

" A mais ampla e simples definição da verdadeira educação que posso imaginar é a seguinte: trata-se de tudo aquilo que está ausente nas vidas daqueles que não estão trabalhando em seu próprio como viver (acho eu)." Richard Mitchell

Mantendo esta afirmativa guardada para breve e futuro resgate, recorro ao famoso diálogo Laques, conhecido como "Método de Perguntas de Sócrates" que tem como premissas:

                  - nossas palavras são o canal de nossos pensamentos;

                  - nossos conceitos impulsionam nosso pensamento;

                  - nossas idéias modelam nossos atos.

1- Escolha uma afirmação amplamente considerada óbvia ou inquestionável:

" Penso que será preciso mais do que inclusão digital. Será preciso inclusão cibercultural. Isto é, será preciso não apenas habilidade com o computador, com a internet e com a mobilidade. Será preciso familiaridade com o estar-junto online, como o compartilhamento online, com a interatividade, com a rede de participações colaborativas, com o que André Lemos chama de “liberação do pólo da emissão”, com o que Pierre Lévy chama de “inteligência coletiva”. "  Prof. Marco Silva

"A formação do professor na cibercultura precisará enfrentar a cultura analógica e livresca do professor, baseada na separação da emissão e da recepção e na distribuição de informação no modelo "um-todos". Precisará abraçar e dialogar com essa cultura cristalizada na escola e na universidade. Nesse clima de proximidade e de motivação poderá então convidá-lo à dinâmica da interlocução, da interatividade ou da intersubjetivdiade cibercultural." Prof. Marco Silva

OBS: Quebrando o protocolo escolhi duas excelentes afirmativas para testar o método de Sócrates, pois concordo com ambas em grande parte.

2-Agora trate essa afirmação como se fosse falsa. Procure situações nas quais ela não de verifica verdadeira:

Admito estar pensando de forma muito abrangente em todos os locais de nosso querido país, ao iniciar tal tentativa de resposta à provacação Socrática. No entanto entendo que precisamos pensar a educação "... como tudo aquilo que está ausente nas vidas daqueles que não estão trabalhando em seu próprio como viver." Caminhando por este percurso, fico a me perguntar, contxtualizado pela diversidade de nosso país, se deveríamos estar pensando em aspectos que me parecem comuns à enorme e, porque não dizer, esmagadora população brasileira, a exemplo de que eles mal sabem interpretar um texto ou desenvolver o mais simplório raciocínio lógico. Não estariam carecendo ainda de uma inclusão cibercultural e sim, como já mencionado, de uma inclusão social. 

Este incômodo me faz pensar em: O que eles precisam é efetivamente a inclusão digital ou estamos com um olhar contaminado pelos poucos incluidos que somos? Se verdadeira for a afirmativa, mais do que inclusão digital e cibercultural, precisamos persistir essencialmente em uma inclusão social elementar, a exemplo do que Maslow considerou como as necessidades secundárias (sociais e de estima). 

Sem este pré-requisito, todo nosso esforço fica limitado a uma pequeníssima parcela da sociedade considerada como incluida. Pensar assim é um começo sem dúvida. Egoísta talvez. Mas porque não incluirmos esta maior parte da população na reflexão, de forma a acelerarmos o desenvolvimento de nosso querido país? É certo que a Universidade Aberta do Brasil é um passo nesta direção do todo - inclusão social dos que podem ingressar em uma universidade. Mas há muito mais do que esta perspectiva a ser resolvida prioritariamente que é  o ensino fundamental. Estamos com esta consciência na equipe? Se sim que maravilha! Caso contrário, o que acham de envolvê-la nas dicussões de formaq explícita?

  3-Segundo Sócrates, uma simples reflexão contrária à afirmativa, é suficiente para que a repensemos, talvez em outro contexto, ou mesmo delimitado claramente por um. (palavras do autor).

 4- Sendo assim, ainda segundo Sócrates, "parece evidente que a afirmação original deve ser alterada para comportar tais exceções."

Por fim, deixo aqui minha inquietude enquanto estudante de educação, quanto ao foco, a prioridade, a estratégia, ao orçamento, a metodologia de implantação, a vontade política, de processos educacionais adequados, pertinentes e acessíveis no curtíssimo prazo à maioria esmagadora de nossa sociedade. Como nos provoca Stephen Kanitz, precisamos de iniciativas sim como esta que pensam o futuro, mas fundamentalmente acabativas para que o presente seja o percurso para alcançamor o futuro desejado.

Espero que de alguma forma tenha trazido um novo ângulo de pensar a cibercultura, quando contextualizada com nossa atual realidade.

Abraços fraternos a todos.

Renê Pimentel.