Livro 1 - Insistindo em cibercultura

Escolas precisam atender as necessidades dos ‘nativos digitais’

Jim Craig

SouthBendTribune.com - February 19. 2006 - www.southbendtribune.com

Eu trabalho na área da educação há 27 anos, sendo12 como professor, e os últimos 15 como administrador.

Quinze anos atrás, quando deixei as salas de aula, ainda era possível afirmar que, embora quase todos os meus alunos proviessem de diferentes estratos socioeconômicos, com diferentes experiências, opiniões e visões do mundo, eles eram bastante parecidos comigo em relação aos seus estilos de aprendizagem.

Contudo, atualmente, estamos vendo em nossas salas de aula um fenômeno que é totalmente sem precedentes. Nossas crianças, seguramente pela primeira vez, não são como seus pais, ou seus professores, nos modos pelos quais elas aprendem. A diferença pode ser creditada à “tecnologia”, em como ela é usada, o que acham dela e como as habilidades são adquiridas.

Mark Prensky , na edição de janeiro de 2006 da Educational Leadership , usa o termo “nativos digitais” para se referir às crianças de hoje. Esses alunos são fluentes na aquisição e uso das ferramentas de tecnologia. Eles têm uma compreensão intuitiva da linguagem digital que os capacita a usar as ferramentas digitais como uma extensão de seus cérebros. Eles são capazes de aprender novas tecnologias com uma velocidade que muitos adultos não conseguem sequer compreender.

Por que é que, pela primeira vez na história, nossas crianças são tão diferentes de nós?

Nós, adultos, somos descritos como “imigrantes digitais”. De modo parecido a alguém que aprende uma língua estrangeira tarde na vida, ao invés de crescer com ela, nós nunca teremos a mesma compreensão intuitiva que as crianças têm. Isso não tem nada a ver com inteligência, e tudo a ver com o modo como se aprende.

Nós vemos cada novo dispositivo que surge no mercado como mais um desafio a ser superado, freqüentemente de modo doloroso. Os nativos digitais não. Eles vêem cada novo desenvolvimento como uma faceta de suas vidas em contínua evolução e desenvolvimento, como alguma coisa que é para ser usada, não apenas compreendida.

O que isso tem a ver com a escola?

Tudo.

Nossos alunos entram nos prédios das escolas em Niles (1 ) todos os dias. Esses prédios – os mais novos tendo cerca de 40 anos – são todos projetados da mesma forma, com as salas de aula visando facilitar a instrução, da mesma forma como era conduzida há 100 anos atrás.

Nossas escolas são longos corredores com várias salas isoladas. Cada sala tem o tamanho necessário para acomodar exatamente 30 carteiras para os alunos e a escrivaninha do professor. Há uma tomada elétrica na frente e uma nos fundos. Isso é tudo o que se precisava quando instrução efetiva significava que o professor falava e os alunos escutavam.

Através do tempo, novas coisas foram, naturalmente, sendo acrescentadas. Agora, há um microfone, alguns computadores, um retroprojetor, algumas telas, algumas estantes de livros, algumas mesas para trabalhos em grupo e um bocado de tomadas, extensões etc.

Não há muito espaço disponível para os alunos. O problema é que isso se tornou um ambiente de aprendizagem bastante ineficiente, e se torna pior a cada ano que passa.

Somos capazes de mostrar melhorias modestas nos resultados dos testes educacionais porque nós nos tornamos muito melhores em fazer coisas do mesmo modo como vêm sendo feitas há mais 100 anos – nunca porque estamos fazendo essas coisas de modo diferente. Estamos no limite dessa linha de melhoria. É tempo de mudar.

Observe, agora, como é a vida de nossas crianças na escola. Elas passam boa parte do dia assistindo às aulas, respondendo a perguntas dos professores, assistindo a filmes ou vídeos sobre temas do currículo, lendo textos impressos em papel, escrevendo seus trabalhos à mão, carregando seus livros de um lado para o outro, e sendo alertados, o tempo todo , para não falarem com os colegas, e prestarem atenção na aula.

Reconhece o quadro? É exatamente o mesmo ambiente de quando eu era criança, e ia para a escola, há 40 anos atrás.

Então a campainha toca. Nossos alunos deixam suas vidas de “museu” e ficam imediatamente imersos em suas vidas digitais. Eles se comunicam através de telefones celulares e mensagens instantâneas, experimentam mídias interativas com DVDs e iPods , e jogam videogames.

Você sabe o que é um blog , um wiki ou podcast ? Não? Pergunte a qualquer criança. Suas mentes estão operando neste mundo tecnológico em uma velocidade e em um nível que é absolutamente diferente de qualquer coisa que nós, imigrantes digitais, possamos compreender.

Agora vem o lado sombrio. Essa existência dupla está fazendo, rapidamente, com que a educação, como a conhecemos hoje, seja ineficaz.

Todos nós podemos lembrar de ter ficado, por exemplo, com sono em uma aula de história, de ficar desenhando no caderno durante uma aula de matemática, ou de se esconder atrás do colega da frente, na aula de francês, para evitar ser chamado.

A escola é, às vezes, maçante.

Hoje, multiplique essa experiência por mil. O fato é que, mais e mais crianças brilhantes, motivadas e talentosas, estão se tornando desinteressadas do estudo em função do processo antiquado das escolas. Suas mentes “nativas digitais” não funcionam do modo antigo. Elas estão entediadas.

Eu estou tendo essa experiência com meus próprios filhos. A mais velha tira somente notas altas, pratica esportes, participa de atividades extra-escolares, é respeitosa com os adultos, adora seus amigos e a maioria de seus professores. Qualquer adulto diria que ela é uma criança capaz de conseguir qualquer coisa.

Há um problema. Ela odeia a escola.Tem horror de ir para a escola, a cada dia. Por que? Ela é uma verdadeira nativa digital e, como tal, está entediada até as lágrimas com o modo como estamos conduzindo a escola em nossos prédios de mais de 40 anos, que foram projetados há mais de 100 anos. Sua mente não funciona dessa forma.

Eu me lembro de ouvir, anos atrás, meus pais dizendo que a televisão “embota a mente e a transforma em gelatina”. Para os nativos digitais, a escola é que, de fato, está embotando a mente. Mostre-me um ambiente de trabalho que usa as ferramentas que temos de usar na escola, e eu lhe mostrarei uma empresa que logo estará fora do mercado.

Isso não é uma questão instrucional. Não é sobre “o básico”. É uma questão de engajamento. Temos que ensinar de um modo diferente para conseguirmos que as crianças se tornem engajadas na escola. Temos que ter um ambiente diferente para fazer isso.

Os planos para o futuro das Escolas de Niles requerem salas de aula muito maiores, áreas de reunião para grandes e pequenos grupos, e estações de trabalho para os nossos alunos. Um total de oito milhões de dólares será dedicado a ferramentas de tecnologia para tornar nossos prédios um local de trabalho do século 21, em vez de uma antiguidade do século 19.

”Eles” não são mais “nós”. Podemos ficar lamentando os dias passados, mas isso não mudará a realidade do que está acontecendo lá fora.

Por favor, junte-se a nós para tornar o futuro de nossas crianças nossa principal prioridade, através da criação de um sistema escolar que esteja atualizado e pronto para engajar os alunos de hoje em uma educação efetiva.

Tradução: Eurico Sadao Kusaka

(1) Niles é o nome de uma cidade localizada ao norte do estado de Indiana, nos Estados Unidos, onde vive o autor. (Nota do tradutor).