Reflexões de Maria da Graça C.B. Pereira

O paradigma construtivista defende que o processo educativo seja centrado no aluno, com enfoque na estrutura dos conhecimentos e dos processos cognitivos necessários para receber a informação e proceder à sua integração nas estruturas existentes, modificando-as em ordem à acomodação da nova informação (Dias, 2004). O aluno é agente activo na construção dos saberes, através da sua imersão e exploração em cenários / ambientes contextualizados, nos quais está envolvido. Neste processo continuo, deve ser construído o conhecimento, gradualmente mais complexo e interligado entre si.

De algum modo, os media do conhecimento acarretaram algum conflito que tem a ver com os modelos vigentes de transmissão de conhecimento e até mesmo com a organização escolar, no seu todo. Estes conflitos podem ser encontrados nos planos macro – políticas educativas e organização curricular vigente; meso – projectos educativos de escola e organização das estruturas intermédias de implementação curricular e micro – projectos curriculares de turma; transmissão de conteúdos e implementação de estratégias de aprendizagem ao nível da sala de aula.

A utilização dos media educativos veio proporcionar uma reflexão entre as concepções teóricas de ensino assistido e aprendizagem assistida. (Dias, 2000) Enquanto o primeiro está ligado a uma visão behaviorista, com a apresentação formal dos conteúdos estandardizados e fechados, onde o professor é detentor do conhecimento e transmissor do mesmo, o segundo está orientado para a construção do conhecimento, de forma flexível e através de trabalho colaborativo, do qual o professor é mais um elemento de colaboração na construção activa do conhecimento dos alunos.

O ensino assistido tem como principal objectivo a eficiência do sistema que acarreta como consequência a passividade dos sujeitos a que se destina e a fraca atenção à individualidade do aluno. Acaba por simplificar de forma exagerada os saberes, não sendo interligados e, consequentemente, contribui para uma diminuição na compreensão dos universos de significação. Nestes modelos, o professor é detentor de todo o controlo sobre os aprendentes, no sentido que condiciona os assuntos, os tempos e as estratégias utilizadas. Como é visto como o detentor dos saberes, os alunos não põem em causa ou questionam, limitando-se a aprender (replicar) conteúdos de forma isolada e não significativa. Os conteúdos não se relacionam entre si nessa disciplina, nem se relacionam com outras áreas de saber. A ligação à realidade e a contextualização das aprendizagens está em segundo plano, quando existe. Nestes modelos, o trabalho colaborativo não é promovido, nem entre alunos, nem entre professores.

Numa abordagem construtivista, sobretudo as orientadas com ajuda de ambientes hipermédia, o professor tem de deslocar-se para novos espaços de acção nesta relação de ensino-aprendizagem. Uma vez que os alunos são activamente envolvidos na construção dos saberes, o docente passa a desempenhar funções de facilitador, orientador, mediador e tutor das actividades do aluno (Dias, 2000).

Este processo evolutivo e de adaptação aos novos papéis da escola e de professor não pode dar-se por ruptura, mas sim por acumulação. Ou, como explica Silva, (2001:848) a passagem de uma configuração a outra, não poderá ocorrer por processo de substituição, mas sim através de um processo cumulativo, com rupturas e continuidades, em que cada fase de evolução condiciona a anterior no seu nível de especialização, orientando-a para uma nova função e intervenção específica. Assim ocorrem também as inovações na educação; gradualmente e através de um processo evolutivo.

Esta evolução e adaptação, neste momento reforça o poder das tecnologias como instrumento fundamental de apoio ao processo de ensino – aprendizagem, no seguimento de metodologias construtivistas. Devemos pensar, no entanto, que as tecnologias não servem de solução para a resolução dos problemas da educação, nem devem os professores delegar nas tecnologias o seu papel intelectual. Como diz Silva (2001) as tecnologias podem mudar a forma como as competências são exercidas mas não transforma um mau professor num bom professor. Como refere o mesmo autor, a tecnologia deve ser encarada como uma estratégia ( Título da comunicação na conferência Challenges 2001 : «A Tecnologia é uma Estratégia» de Bento Duarte da Silva ); estratégia essa que tem como objectivo interferir no processo educativo, tendo em vista a sua optimização ao nível da construção das aprendizagens.

Não pretendendo minimizar o papel dos ambientes hipertexto / hipermédia, com todas as claras vantagens que trazem à educação, não podemos pretender implementar um espaço onde a técnica seja demasiado sobrevalorizada. A renovação da escola e dos espaços de aprendizagem tem de promover a integração e utilização destes ambientes, não esquecendo, no entanto, que o papel do intermediário deve ser reforçado e reconhecido (Silva, 2001). O professor é esse intermediário fundamental.

Como lembra Silva (2001), a utilização pedagógica das TIC deve basear-se numa política escolar facilitadora e também na adequada formação dos professores para o seu uso educativo. Nesta formação poderá estar a solução e o incentivo para a efectiva mudança ao nível de concepções educativas do sistema escolar, integrando as tecnologias como elemento de renovação educativa.

De facto, parece ser nesta falta de incentivo ao nível da formação que parece estar a razão do, ainda, fraco impacto da tecnologia na educação. A principal razão para esta renitente utilização tecnológica como meio educativo, na maioria dos casos, parece já não poder atribuir-se a razões materiais, nem aos escassos meios existentes nas escolas. No entanto, este equipar das escolas não tem vindo acompanhado de outras mudanças estruturais, fundamentais para apoiar este processo de mudança. A mudança vem de fora para dentro, quase que imposta às escolas e aos docentes sem se promover antecipadamente uma mudança de perspectivas educacionais, usando para isso a sensibilização / formação dos docentes e dos gestores. Temos assim, escolas bem equipadas ao nível tecnológico, onde a tecnologia serve apenas optimizar práticas behavioristas instrucionais, tornando-as mais eficientes (Albirini, 2007). O que temos observado são mudanças de forma e não de conteúdo, uma vez que se continua a ensinar basicamente da mesma forma que se aprendeu (Dils, 2004).

Mais ainda, uma vez que a mudança tem sido mais imposta do que motivada pelos intervenientes educativos directos, as dificuldades técnicas com as quais os professores também se deparam, acabam por ser mais um entrave à sua utilização efectiva e continuada.

O que se observa é que não bastará equipamentos nem projectos exteriores que facultem a alteração de práticas educativas baseadas nos meios que as tecnologias disponibilizam, é necessária uma reestruturação mais alargada. Uma reestruturação ao nível material, físico, organizacional e humano. Os computadores estão descontextualizados, devido à organização instrucional das escolas; uma escola que está ainda vocacionada para uma avaliação de produtos e não de processos; criada para o controlo institucional.

É importante reinventar a escola. Equipar tecnologicamente, com uma formação dos docentes adequada e motivada; alterando as politicas educativas, os meios e os objectivos de avaliação; os currículos e até as condições físicas das escolas. O paradigma tradicional não pode integrar em si a era digital, com todas as alterações e potencialidades educativas inerentes, enquanto as contradições ao nível do enquadramento das mesmas não forem solucionadas. A escola tem de conseguir utilizar os meios, não bastará coexistir com eles, numa aparente modernidade.