PixelBot: a Inteligência Artificial associada à EAD
Fonte: http://www.ejrworldlearning.com.br/ (pesquisa realizada em março/2003)
PixelBot: a Inteligência Artificial associada à EAD
Paulo C. Cunha Filho e André M. Neves
Está cada vez mais claro que o Brasil deve promover a utilização das tecnologias da informação e da comunicação com o objetivo de educar para incluir socialmente. Ou seja, estimular a produção e o intercâmbio de experiências que ampliem o potencial formador e permita a construção de um país mais articulado, produtor de conhecimento, que possa expandir a ocupação do ciberespaço. Mas, se este projeto é cada vez mais evidente, ainda permanece imensa a perplexidade diante da expansão dos projetos de educação a distância (EAD) no Brasil.
Está cada vez mais claro que o Brasil deve promover a utilização das tecnologias da informação e da comunicação com o objetivo de educar para incluir socialmente. Ou seja, estimular a produção e o intercâmbio de experiências que ampliem o potencial formador e permita a construção de um país mais articulado, produtor de conhecimento, que possa expandir a ocupação do ciberespaço. Mas, se este projeto é cada vez mais evidente, ainda permanece imensa a perplexidade diante da expansão dos projetos de educação a distância (EAD) no Brasil. Universidades e outras instituições que oferecem cursos semipresenciais e não-presenciais ainda são vistas de forma preconceituosa. Mudanças sempre assustam, apesar das óbvias vantagens para a economia de integrar, via EAD, o sistema educacional aos clusters de desenvolvimento.
A Universidade Federal de Pernambuco é pioneira no Brasil na pesquisa e no uso da Internet como plataforma pedagógica. A instituição sabe que as pessoas vivem cada vez mais (e trabalham cada vez mais) num mundo onde as tecnologias da informação e as competências profissionais mudam com extrema rapidez. O que significa que muita gente procura soluções para ficar atualizada e para se formar fora – ou além - dos ambientes tradicionais da educação.
Durante muito tempo, a universidade – ou setores da universidade - simplesmente ignorou o problema de quem não podia estar nos campi ou o desejo de quem acreditava poder estudar de outra maneira. Ignorar problemas e desejos não resolve nada e é preciso enfrentar esse quadro. EAD bem aplicada é uma saída de qualidade. Por isso, a UFPE, um dos oito maiores centros de ensino e pesquisa do Brasil, implantou, em 1996, o Virtus - Laboratório de Hipermídia (http://www.virtus.ufpe.br ). O Virtus integra atualmente mais de 20 pesquisadores de áreas como informática, comunicação, design, psicologia cognitiva, educação pesquisando aplicações diversas em tecnologias da comunicação e da informação. Entre elas, tecnologias educacionais e aulas via Internet – para expandir, no tempo e no espaço, a qualidade educacional da UFPE.
Se considerarmos que a Educação a Distância tem três gerações – sendo a primeira a que utilizou a mídia impressa e os correios; a segunda, o rádio e a TV e a terceira, as mídias digitais e a Internet – o foco do Virtus é o modelo mais avançado, porque só ele permite, de fato, interação em tempo real entre professores e estudantes. Atualmente, a UFPE é a instituição de ensino superior do Brasil com mais salas de aula virtuais. O sistema desenvolvido pelo Virtus chama-se VirtusClass (http://www.VirtusClass.org ). Atualmente, são mais de 1600 ambientes virtuais de estudo (AVE). A média de usuários por ambiente é de 10 pessoas, embora haja AVEs com mais de 30 alunos inscritos. Assim, o sistema envolva em torno de 16 mil alunos por semestre, incluindo alunos de graduação, de pós-graduação, tanto da UFPE como de outras instituições, já que o sistema desenvolvido pela UFPE é aberto à comunidade e gratuito.
Os Ambientes Virtus de Estudo do Virtus foram desenvolvidos a partir de uma arquitetura em que são disponibilizados módulos de interação, comunicação e gestão, com dezenas de ferramentas que permitem aos usuários a disponibilização de informações e a criação de uma comunidade virtual capaz de produzir conhecimento num processo cooperativo de aprendizagem baseado numa visão pedagógica vygotskyana [VYGOTSKY 1998]. Com uma vantagem adicional sobre sistemas semelhantes: qualquer pessoa pode criar instantaneamente um AVE a partir do preenchimento de um simples formulário eletrônico.
Este ano, uma novidade foi acrescentada. Os pesquisadores que lidam com Inteligência Artificial no Virtus integraram ao AVE um novo sistema: PixelBot – um robô para conversar em português com estudantes e professores. É uma experiência inovadora, em fase avançada de testes, sobre a qual gostaríamos de nos aprofundar um pouco.
PixelBot: IA + EAD
Alan Turing, em 1950 propôs a idéia de um jogo, The Imitation Game, onde três participantes, uma mulher (A), um homem (B) e um interrogador de qualquer sexo (C) deveriam ficar em salas separadas uma da outra para o interrogador conversar com o homem e a mulher através de terminais de computador, digitando sentenças que seriam respondidas por cada um dos dois participantes. Ao final do diálogo, que duraria um tempo pré-determinado, o interrogador deveria ser capaz de dizer quem é o homem e quem é a mulher [TURING 1950]. No artigo, Turing questiona a possibilidade de substituirmos (A) ou (B) por uma máquina, dando ao interrogador um novo objetivo, o de ser capaz de dizer quem é humano e quem é máquina ao final do diálogo.
Usando o jogo como metáfora, Turing discute uma das questões que mais intrigou a ciência da computação na segunda metade do século XX: Can machines think?. Observando o jogo proposto por Turing, percebemos uma situação onde a máquina deveria imitar o homem, dificultando o trabalho do interrogador. Para Turing, esta situação é um indício de que o pensamento da máquina poderia ser considerado como uma inteligência simulada, uma imitação de atitudes humanas que são consideradas inteligentes.
O artigo de Turing continua sendo polêmico mesmo nos dias de hoje, em pleno século XXI, a máquina que pensa descrita por Turing ainda parece obra de ficção científica. Em 1990, o jogo proposto por Turing passou a ser conhecido como Turing Test e foi redesenhado por um grupo de pesquisadores do Cambridge Centre for Behavioural Studies (http://www.behavior.org/ ), transformando-se em um evento de grandeza internacional, denominado Loebner Prize [LOEBNER 2001]. O evento analisa o desempenho de programas de computador que conversam com os avaliadores do concurso em linguagem natural, premiando com U$ 2.000,00 aquele que mais se aproximar do diálogo com humanos e com U$ 100.000,00 aquele que conseguir conversar como se fosse um humano. Até hoje, nenhum programa conseguiu receber o grande prêmio. O primeiro a receber o prêmio de U$ 2.000,00 do evento foi The PC Therapist, em 1991, escrito por Joseph Weintraub da empresa Thinking Systems Software.
O final do século XX foi marcado, como se sabe, pela popularização da Internet e o ciberespaço explora ao limite as possibilidades de interação entre seres humanos através de redes de computadores. Ferramentas como correio eletrônico e salas de chat são hoje utilizadas por milhões de pessoas nos mais diversos pontos do planeta. Nesse contexto, algumas empresas de software vislumbraram, no início da década de 90, uma grande possibilidade de aplicação de sistemas capazes de conversar com seres humanos em linguagem natural, semelhantes àquele mencionado por Turing em 1950.
Atualmente, os sistemas que conversam com seres humanos em linguagem natural são denominados chatterbots [LAVEN 2001], sendo amplamente utilizados na Internet para os mais diversos fins (e.g., conversar em salas de chat sobre temas livres ou específicos, vender algum produto, representar empresas, dar suporte técnico, auxiliar estudantes em cursos a distância etc). Observando os chatterbots existentes no mercado, identificamos três gerações de robôs que diferem umas das outras no que concerne o paradigma tecnológico a partir do qual o sistema foi projetado e implementado.
A primeira geração é baseada em técnicas de casamento de padrão e regras gramaticais, tendo como seu maior expoente ELIZA, um chatterbot desenvolvido no MIT Artificial Intelligence Lab (http://www.ai.mit.edu ) pelo Dr. Joseph Weizenbaum, um dos fundadores do laboratório [WEIZENBAUM 1966]. A segunda geração é baseada em técnicas de inteligência artificial, como regras de produção e redes neurais, e tem como principal expoente JULIA, um chatterbot desenvolvido por Michael Mauldin no Center for Machine Transalation da Canergie-Mellon University [CHEONG 1996]. Esta geração, apesar do maior grau de sofisticação de suas ferramentas, não conseguiu resultados muito superiores aos obtidos nos robôs de primeira geração, fato que pode ser demonstrado nos resultados dos concursos anuais do Loebner Prize.
Recentemente, em 1995 surgiu uma terceira geração de chatterbots, baseados em uma nova tecnologia, o uso de linguagens de marcação para construção de bases de conhecimento. O maior incentivador desta nova geração de chatterbots é o Dr. Richard Wallace [WALLACE 2001], que desenvolveu uma linguagem de marcação denominada AIML (Artificial Intelligence Markup Language) para definição da base de conhecimento de um robô chamado ALICE (Artificial Linguistic Internet Computer Entity). ALICE tem conseguido resultados bem superiores aos chatterbots de primeira e segunda geração, ganhou as versões do Loebner Prize de 2000 e de 2001, sendo que nesta última, o robô conseguiu obter de um dos juízes uma nota mais alta que um humano, fato inédito no evento e que a transforma em forte candidata ao grande prêmio nos próximos eventos.
O projeto PixelBot, um chatterbot que conversa em português, está sendo desenvolvido no Virtus, desde novembro de 1999. No projeto contamos com uma equipe multidisciplinar que envolve professores e estudantes de graduação e pós-graduação da Universidade Federal de Pernambuco. No grupo, estão dois alunos de doutorado (psicologia Cognitiva e Ciência da Computação), quatro alunos de mestrado (dois de Psicologia Cognitiva e dois de Ciência da Computação) e quatro alunos de graduação (dois de Design, um de Ciência da computação e um de Comunicação Social).
PixelBot foi o primeiro chatterbot baseado em AIML que fala português no mundo, tratando-se de um experimento pioneiro, que tem sido citado também em websites de referência internacional sobre chatterbots, a exemplo do SimonLaven page, um dos principais espaços de divulgação e troca de experiências sobre robôs que conversam no ciberespaço e do website da fundação ALICEbot, responsável pela produção e gestão de AIML.
PixelBot está agora em sua terceira versão, resultado de experimentos e desenvolvimentos dos trabalhos dos estudantes de pós-graduação envolvidos no projeto. Nesta versão, ele é capaz de manter um diálogo com um grau razoável de coerência com seres humanos, e, recentemente ganhou um módulo de aprendizagem, vinculado às salas de aula virtuais do VirtusClass, que permite aos professores ensinarem conceitos ao robô. Com esta versão, acreditamos que PixelBot poderá ser bastante útil como um apoio aos estudantes que procuram informações nas salas de aula virtuais em momentos onde o professor e outros colegas não estejam conectados.
Referências:
[TURING 1950] Turing, A. M. Computing machinery and intelligence, Mind, Vol. 59, No. 236, 433-460.
[LOEBNER 2001] Loebner Prize Contest. online at http://www.loebner.net
[LAVEN 2001] Laven, S. online at http://www.simonlaven.com
[WALLACE 2001] Wallace, R. S. Dont read me - A.L.I.C.E. and AIML documentation, available online at http://www.alicebot.com/dont.html
[VYGOTSKY 1998] Wygotsky. L. S. Pensamento e Linguagem. São Paulo: Martins Pontes, 1998.
[WEIZENBAUM 1966] Weizenbaum, J. Eliza - a computer program for the study of natural language communication between man and machine, Communication of the Association for Computing Machinery 9: 36-45.
Sobre os autores:
Paulo C. Cunha Filho ( paulo@npd.ufpe.br ) é professor do Programa de Pós-graduação em Comunicação da Universidade Federal de Pernambuco, doutor pela Universidade de Paris I (Panthéon-Sorbonne) e coordenador do Virtus - Laboratório de Hipermídia da UFPE. André M. Neves ( ammn@zipmail.com.br ) é professor do Departamento de Design e doutorando em Informática na Universidade Federal de Pernambuco. É coordenador do Virtus - Laboratório de Hipermídia da UFPE.